Como já mencionamos em alguns outros artigos, aqui, aqui e aqui. A eficiência energética é uma questão que não sofre por falta de soluções. Tecnologias mais eficientes, economicamente viáveis e em nível comercial existem aos montes. O grande gargalo da eficiência energética hoje é a gestão e processamento de dados confiável o suficiente para subsidiar um sistema de tomada de decisão das empresas. Mais uma vez enxergamos esse alinhamento no recém publicado Atlas da Eficiência Energética publicado pela Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE) em parceria com o International Energy Agency (IEA). Aqui vou tomar a liberdade de sugerir uma evolução na análise da publicação, considerando um diagrama de ineficiência energética na indústria.
A pesquisa extensiva lista de forma objetiva barreiras que impedem que ações de eficiência energética aconteçam, no entanto não faz uma análise sobre o que é causa raiz e o que é sintomático. Apesar de parecer apenas mais um detalhe, essa discussão é fundamental para não direcionar a atenção do gestor industrial (ou gestor de facilities) em direção a sintomas que dificilmente serão resolvidos por completo caso a causa raiz não for tratada. É como tomar aspirina na esperança de que a enxaqueca crônica nunca mais o assole.
Inicialmente as principais barreiras de implementação são listadas:
- Baixa priorização dos projetos de eficiência energética pelas empresas e consumidores;
- Falta de conhecimento sobre o potencial e medidas de eficiência energética;
- Carência de informações e dados de energia;
- Falta de confiança sobre os reais custos e benefícios das ações de eficiência energética;
- Modelos de negócio para realização de investimentos em eficiência de energia;
- Resistência à mudança.
A hipótese sustentada aqui é de que a conexão entre as barreiras sob a forma de um diagrama de causalidade poderia contribuir com o entendimento sobre as causas raiz de um avanço tímido no aumento da performance de eficiência energética no Brasil na última década. A representação facilita o entendimento de que muitas das barreiras compõe um eixo sintomático que pode confundir o gestor que está na ponta da linha tentando avançar em sua estratégia de gestão energética. As causas raiz, que desencadeiam todo o processo de apatia em relação à projetos de eficiência energética devem ser priorizadas no fluxo de ações remediadoras, tanto no contexto a nível de unidades consumidoras quanto a nível de políticas públicas.

Figura: diagrama de ineficiência energética na indústria.
Essa lógica de causalidade provavelmente também tem relação com o fato do setor industrial ter freado a evolução do índice ODEX, indicador de conservação de energia que considera todo o setor industrial ponderado pela capacidade produtiva. Enquanto o setor residencial obteve uma redução de mais de 20% o industrial reduziu apenas 7%. É evidente que a indústria tem desafios que envolvem complexidade e investimentos com ordens de grandeza superiores do que os setores residencial e de transportes, além de sofrer com a capacidade ociosa durante a crise dos últimos anos. No entanto, a lógica de causalidade mostrada acima sem dúvidas contribuiu de forma mais aguda para o setor industrial frear todo o índice do país.
A falta de acesso aos dados e de conhecimento necessário para transformá-los em informação útil para tomada de decisão formam a dupla de causa raiz responsável pelo disparo de uma série de efeitos em cadeia que levam a comportamentos relacionados aos sintomas. Além das barreiras já citadas na publicação original, também adicionamos outros dois fatores externos que influenciam diretamente a criar ambientes que potencializam os sintomas.
Ao focar na causa-raiz podemos evitar o desperdício de recursos com medidas paliativas focadas no curtíssimo prazo e começamos a enxergar o problema de forma mais estratégica e sistêmica. Por isso, o primeiro passo para destravar o potencial da eficiência energética é construir uma estrutura de coleta, organização e análise dos dados (falamos sobre isso neste post aqui). Isso pode ser feito tanto internamente quanto por uma empresa especializada, o mais importante é que seja feito.